Revoluç

Finalmente, em meio a cenas de regozijo, Hugo Chavez foi levado de helicóptero militar ao Palácio Miraflores e reintegrado como presidente da Venezuela.

Provocação contra-revolucionária

A contra-revolução na Venezuela foi desencadeada pelas greves anti-Chavez na indústria petrolífera venezuelana. Eram contra-revolucionárias - o equivalente à greve dos caminhoneiros organizada pela CIA contra o governo de Allende no Chile. Foram organizadas pela administração da industria do petróleo venezuelana, a PDVSA, em aliança com a ala direitista dos burocratas da CTV. Que o movimento simpático à reação tenha sido capitaneado pelos interesses petrolíferos não foi acidental. Os diretores da PDVSA necessitaram pôr termo às restrições relativas à produção petrolífera e retornar à posição prévia na qualidade de único maior fornecedor de petróleo aos Estados Unidos.

O golpe em si decorreu dos eventos de 11 abril, quando uma demonstração dita de 350.000 foi organizada contra o governo Chavez. Desde que a mídia na Venezuela é anti-Chavez de forma virulenta, este número é quase certamente exagerado. Uma agencia noticiosa verificou que os manifestantes realmente não superaram os 50.000. Noticiou-se que as forças de segurança pró-Chavez teriam aberto fogo contra pessoas desarmadas anti-Chavez, matando 15 delas e ferindo outras 157. A ala direitista usou a notícia, real ou falsa, como desculpa para exigir a renúncia do presidente Hugo Chavez. Com efeito, relatos posteriores indicaram que a maior parte dos mortos eram manifestantes pró-Chavez aparentemente alvejados por atiradores de tocaia postados em telhados. Tudo não passou de manifesta provocação.

Os interesses de classe por trás do golpe eram óbvios. O cabeça do governo contra-revolucionário era um rico homem de negócios e dirigente de associação patronal. Sua primeira providência foi extinguir a chamada legislação antiinvestimento de Chavez, isto é, todas as leis que objetivassem defender os interesses da Venezuela e elevar o padrão de vida das massas. A corrupta e podre burguesia venezuelana é incapaz de desempenhar um papel progressista. Se postos em pratica seus planos, isto significaria colocar o país e suas consideráveis reservas petrolíferas sob domínio do imperialismo americano. A administração da PDVSA já tinha traçado um plano para restabelecer e expandir a produção, que podia reconduzir a um nível diário de 300.000 barris acima da quota da OPEP.

O papel do imperialismo dos Estados Unidos

O golpe foi dirigido pela burguesia venezuelana e seus serviçais nas forças armadas. Mas a mão que puxou os cordéis estava obviamente em Washington. O plano nasceu e cresceu nos Estados Unidos. A administração Bush deleitava-se ao pensar em Chavez algemado, e estava se preparando para apossar-se da indústria petrolífera venezuelana pela porta dos fundos, concedendo “ajuda” direcionada ao novo governo de Caracas na forma de investimentos petrolíferos. É a parte mais ampla da estratégia do imperialismo estadunidense, após 11 de setembro, para intervir mais agressivamente por toda parte.

O interesse imperialista na Venezuela é, em parte, econômico. Há comentários na América sobre uma recuperação econômica. Mas é ainda débil e instável. A demanda nos Estados Unidos melhorou, mas na Europa ocorre num passo bem menor, e o Japão permanece em graves apuros. Em tal situação, os mercados petrolíferos são necessariamente voláteis. E qualquer ruptura na produção petrolífera a esta altura teria as mais sérias conseqüências para a economia mundial. O que se requer para uma sólida recuperação não é apenas aumento na demanda (que pode ter caráter episódico), mas uma elevação na lucratividade. As margens de lucro ainda permanecem deprimidas. Um aumento no preço de qualquer um dos fatores de produção deprimiria as margens de lucro ainda mais, empurrando a economia mundial para uma queda até mesmo mais abrupta do que antes. Neste sentido, as convulsões no Oriente Médio pairam tal qual uma ameaçadora nuvem tempestuosa por sobre o cenário econômico.

A questão Israel-palestina está acirrando os ânimos em toda a região de forma alarmante - nela o Hezbollah, a Síria, a Jordânia e o Egito envolvem-se cada vez mais. As coisas ficam mais complicadas! E então vem à baila o preço do petróleo... Este tem flutuado violentamente, implicando em cortes nos suprimentos da OPEP, ameaças de guerra, aumento da violência no Oriente Médio e instabilidade política na própria Venezuela. O caos no Oriente Médio parece ter forçado Washington a adiar seus planos para atacar o Iraque. Tudo indica que a reunião cume do último fim de semana entre o presidente dos Estados Unidos e o primeiro-ministro Tony Blair em Crawford (Texas) não produziu resultados muito positivos. Até mesmo um entusiasta de guerras tal qual Tony Blair foi compelido a advertir Bush, reservadamente, de que por vezes é melhor avaliar as circunstâncias antes de agir. O adiamento não significa, porém, abandono da idéia. Mais cedo ou mais tarde botas americanas pisarão no Iraque.

Bush está determinado a insistir com seus planos de agressão militar ao Iraque, mas sente-se desconfortavelmente ciente de que o caos geral no Oriente Médio - acentuado pelo fracasso da missão de Powell em forçar uma retirada de Israel na Palestina - pode levar a uma queda catastrófica da produção petrolífera, o que, de resto, poderia conduzir a uma brusca elevação de preços e ao afastamento de qualquer perspectiva de recuperação econômica. Os Estados Unidos têm urgente necessidade de garantir o fornecimento do petróleo situado a cômoda distância de milhares de milhas do Oriente Médio.

Os imperialistas procuram manter baixo o preço do petróleo. Há rumores indicativos de que os produtores russos, seguindo o alinhamento colaboracionista de Putin com o imperialismo estadunidense, traçam planos para abocanhar fatia do mercado iraquiano antes do 30º dia do fim do embargo da exportação de petróleo, convocado no começo desta semana, em protesto pela recente ocupação de territórios palestinos na Margem Ocidental. Neste drama de alcance mundial, a Venezuela é um peão ponderável. As políticas de Hugo Chavez ameaçavam os interesses das grandes consórcios petrolíferos causando maior preocupação para as bandas de Washington.

Com a crescente instabilidade no Oriente Médio - onde o Iraque acaba de reduzir sua produção petrolífera - interessa os Estados Unidos restringirem a coesão da OPEP. Antes da posse de Chavez, em fevereiro de 1999, a Venezuela era que desrespeitava as quotas estabelecidas pela OPEP. Recentemente, à altura de dezembro de 1999, a Venezuela estava excedendo sua quota de produção num milhão de barris. Mas o novo governo, em sua tentativa de opor-se ao imperialismo dos Estados Unidos, transformou-se no mais entusiástico respeitador das quotas. Durante sua presidência, Chavez pressionou em prol de numerosos cortes na produção e deu uma volta pelo mundo no ano passado para forçar reduções, obtendo algum êxito. Isto inevitavelmente colocou a Venezuela em conflito com as grandes companhias de petróleo e o imperialismo americano.

Mas há uma dimensão mais ampla para as atividades do imperialismo americano na Venezuela, que em muito transcende a questão econômica. O setor militar norte-americano está ativamente envolvido na guerra suja contra as guerrilhas da FARC e da ELN na vizinha Colômbia. É sobejamente conhecido que Chavez mantinha relacionamento amistoso com as guerrilhas colombianas. O fato constituiria razão suficiente para a CIA buscar sua deposição.

No entanto, a razão principal não é nada disso. O fundamental é que a radicalização das massas na Venezuela ameaçava espalhar-se por outros paises latino-americanos, vasta região que se encontra no momento angustiada por profunda crise econômico-social. Ao remover Chavez do poder, o imperialismo americano esperava apertar suas garras em torno a América Latina. Seria uma lição para as massas noutros paises. E, por acréscimo, a instalação de governantes mais amigáveis e flexíveis em Caracas levaria a um aumento da produção petrolífera venezuelana, e conseqüentemente implicaria em maior estabilidade dos preços do petróleo. Em resumo, uma proposição de negócios muito saudável! Tudo isto requeria um pequeno golpe.

Previsivelmente, o golpe direitista foi recebido com mal disfarçada satisfação pela burguesia internacional. Estes hipócritas descreveram os eventos de 11 de abril como um “retorno à democracia” na Venezuela! Esta foi a linha assumida pelo diário madrileno E Pais. Contudo, o mesmo jornal foi compelido subseqüentemente a divulgar testemunhos pessoais afirmando que eram muitos os casos de brutalidade e violência praticados pelas forças contra-revolucionárias. Partidários de Chavez foram forçados a esconder-se à medida que as forças armadas punham-se a deter os apoiadores do governo. Prisioneiros eram levados a quartéis do exercito onde eram surrados e torturados. Tais são os métodos dos “democratas” burgueses na Venezuela.

O comandante do exército venezuelano general Efraim Vasquez Velasco - principal líder da rebelião - tentou evitar qualquer movimento contra o novo governo ao implementar um agressivo “plano de desarmamento”. O novo regime iniciou imediatamente buscas em propriedades particulares e veículos, com a intenção de apreender todas as armas não registradas e prender adeptos de Chavez. Determinou que o exército atuasse em colaboração com o procurador-geral nacional para “identificar, desarmar e desarticular” as milícias civis organizadas sob a denominação de Círculos Bolivarianos.

Uma caça às feiticeiras foi iniciada contra adeptos de Chavez, membros do parlamento e funcionários do governo legalmente eleito. Vasquez Valasco confirmou que os militares e policiais civis estavam realizando uma busca nacional para deter o vice-presidente Cabello e o prefeito municipal libertador Freddy Bernal, sob alegação de que Cabello era o principal organizador e financiador dos Círculos Bolivarianos armados, e que se supunha Bernal houvesse comandado atiradores de tocaia que alvejaram, em 1’1 de abril, os manifestantes anti-Chavez de telhados de casas no centro de Caracas.

Os reacionários vitoriosos puseram-se sistematicamente a abolir todos os decretos progressistas do governo deposto, que fora eleito por esmagadora maioria. Eles defendiam poderes absolutos para si próprios - gangues de conspiradores não eleitos - enquanto cancelavam 49 decretos de um governo democraticamente eleito, suspendendo e prendendo membros eleitos da Assembléia Nacional, mais 20 juizes (chega de perder tempo em preservar a independência do judiciário!), 12 governadores e todos os prefeitos pró-Clhavez. Todas estas medidas atraíram aplausos das “democracias” ocidentais como “passos destinados à restauração da democracia” na Venezuela! George Orwell poderia escrever uma novela muito boa em torno do tema.

De acordo com todos os relatos disponíveis, os contra-revolucionários conduziam-se excessivamente confiantes. Estavam convencidos que havia pouco ou nenhum perigo de que os adeptos de Chavez pudessem lançar um contra-golpe com êxito para recuperar o controle do governo. No pior dos casos, eles previram o surgimento de algumas ocorrências isoladas de violência em Caracas e noutras áreas urbanas, as quais facilmente podiam controlar. Também temiam que elementos pró-Chavez em áreas rurais pudessem tentar ligar-se às guerrilhas colombianas e empreender operações no território venezuelano.

Mas esses senhores não contavam com a reação das massas venezuelanas.A despeito do fato de que Chavez não houvesse levado a revolução a seu termo, e a crise na Venezuela tivesse começado a gerar efeitos adversos, as massas instintivamente compreenderam a ameaça representada pela contra-revolução. Recuperando-se do choque inicial, tomaram as ruas de Caracas e de outras cidades, varrendo tudo que encontraram pela frente.

O papel das massas populares foi decisivo para derrotar a contra-revolução. Defrontado pela mobilização espontânea das massas, as tentativas para impor uma ditadura diluiu-se. Sem o apoio das forças armadas, a burguesia não podia estabelecer a ditadura. E ainda, a reação popular rapidamente agravou as cisões dentro do exército. Não se supunha que acontecesse! Parece que a presidência de vida curta de Carmona desfez-se porque os burgueses contra-revolucionários - sem dúvida sob pressão da CIA - tentaram ir muito longe e muito depressa, abrindo um racha entre os milicos e um setor dos generais que, muito corretamente, temeram que sobreviesse uma guerra civil.

Os líderes golpistas começaram a cindir-se e a discutir entre si. A partir desse momento, o golpe estava condenado. Stratfor relata fatos que levaram ao colapso:

“As medidas econômicas e políticas anunciadas por Carmona ao assumir o governo em 12 de abril - inclusive a dissolução da Assembléia Nacional e a demissão dos juizes da Suprema Corte e de ouros altos funcionários governamentais - não foi o que tinha sido acordado pelas facções políticas, civis e militares que formavam a coalizão centrodireita de apoio a Carmona e excediam os objetivos da centrodireita moderada.

“O golpe dentro do golpe da ala direita foi montado por um grupo de oficiais militares protegidos do general Ruben Rojas, em parceria com empresários e políticos ultra-conservadores - alguns dos quais afiliados à organização católica extremamente conservadora Opus Dei. O ministro da defesa do governo de Carmona, vice-almirante Hector Ramirez Perez, é protegido de Rojas de longa data, enquanto a escolha de Carmona para o ministério do exterior recaiu em José Rodriguez Iturbe, pertencente às fileiras da Opus Dei.”

Noutras palavras, os reacionários excederam a si mesmos. Quando Carmona anunciou a dissolução da Assembléia Nacional, a coalizão cívico-militar de apoio ao governo provisório de Carmona ruiu imediatamente, enquanto o equilíbrio de forças se voltava em favor de Chavez. Com o crescimento dos protestos nas ruas, o apoio popular e sindicalista a Carmona evaporou-se, e as FAN´s também cindiram-se em pelo menos três grupos distintos agora em luta poder dentro do estamento militar.

Compreendendo que a situação escapava de suas mãos, Vasquez Velasco, numa alocução televisiva condicionou seu apoio a Carmona à imediata reintegração das prerrogativas da Assembléia Nacional. Carmona logo cedeu. Todavia, restabelecidos os poderes da Assembléia Nacional, Lara, seu presidente, às pressas depôs Carmona; Cabelo prestou juramento e foi reempossado como presidente provisório. Enquanto isto, Chavez retornava ao palácio presidencial. A rebelião ruiu como um castelo de cartas. E o exército rachou às escâncaras.

É claro que Chavez ainda conta com considerável apoio, não apenas junto às massas mas também no exército. O general Baduel declarou-se em rebelião contra o governo Carmona mesmo antes que este prestasse juramento e assumisse a presidência em 12 de abril. Exerce o general o comando de um corpo de elite de 2.000 pára-quedistas e um vasto arsenal de armas e munições, o que não constitui ameaça insignificante! O general de divisão Julio Garcia Montoya, secretário efetivo do Conselho Nacional de Segurança e Defesa, também manifestou-se em rebelião e tornou pública sua oposição ao governo interino através de entrevista à televisão cubana, logo depois retransmitida para a Venezuela.

Continua Stratfor: “Um grupo dirigido pelo general Efrain Vasquez Valasco, comandante do exército, que emergiu em 11-12 de abril como líder da facção centrodireita integrada por oficiais de careira que se opõem aos propósitos de politizar as FAN´s e de afastar o país da democracia capitalista. O grupo de Vasquez Velasco negociou o acordo com os dirigentes da oposição que instalou Carmona como presidente provisório de consenso.

“Um segundo grupo compõe-se de oficiais ultra-conservadores em quatro setores das FAN´s. Alguns destes oficiais são de longa data protegidos de Rojas, e outros - inclusive membros da Opus Dei - provenientes do Partido Democrata Cristão-COPEI, por longo tempo dominado pelo ex-presidente Rafael Caldera, que é também sogro de Rojas. As fontes de Stratfor afirmam que este grupo planejou dar um golpe contra Chavez em 27 de fevereiro, mas o intento abortou sobre forte pressão dos camaradas centristas dentro das FAN´s e da administração Bush em Washington.

“O terceiro grupo compõe-se de oficiais pró-Chavez, incluindo o general Raul Baduel, que comanda a 42ª Brigada de Pára-quedistas sediada em Maracay, Estado de Aragua. É a antiga unidade de Chavez; Baduel é um de seus mais íntimos amigos e aliados políticos no exército”, dizem as fontes.

Aléxis de Tocqueville assinalou há muito tempo que a revolução começa no cimo. Os últimos acontecimentos demonstram claramente que a classe dominante na Venezuela está cindida. E o racha estende-se até o topo do estado e das forças armadas. Tal fato, como explicou Lenine, constitui a primeira condição para uma revolução. A tentativa falha da contra-revolução exacerbou essas contradições e cisões da classe dominante, e criou as mais favoráveis condições para uma mudança social completa. Os reacionários forçosamente ficaram na defensiva e, por enquanto estarão paralisados e incapazes de agir. Uma diretriz corajosa vinda de cima seria suficiente para privar a reação de sua base social e permitir até mesmo uma transferência pacífica do poder para a classe trabalhadora.

Há momentos na historia que são decisivos. É uma questão de “isto ...ou aquilo”. A conta-revolução lançou um desafio. Sua primeira tentativa falhou. Mas não será a última! A burguesia e seus pontos de apoio no meio militar estão determinados a ver-se livre de Chavez de uma forma ou de outra. Sua resolução será fortalecida por Washington, que tem muitos motivos para desejar a queda do regime de Chavez.

Marx assinalou que a revolução necessita do látego da contra-revolução. O estado de coisas presente é reminiscência do tancazo do Chile - a primeira tentativa para depor o governo de Allende, derrotada pelo movimento de massas. Não há nenhuma dúvida de que se Salvador Allende tivesse aproveitado o momento para conclamar às massas à ação, a revolução teria facilmente tido êxito. Mas ao desperdiçar-se a oportunidade a contra-revolução nas forças armadas - recordemos que se supunha Pinochet fosse um “democrata” leal - reagrupou-se e preparou o golpe sangrento poucos meses depois. Isto representa séria advertência para os trabalhadores venezuelanos!

Depois dos eventos de 11-12 de abril, a permanece completamente instável. Nada foi solucionado. A situação assemelha-se em muitos aspectos a que existiu em Cuba em 1960. Geralmente não se compreende que quando Castro chegou primeiramente ao poder, não tencionava nacionalizar os meios de produção. Seu programa visava apenas a reformas democráticas que não iam alem das limitações do sistema capitalista. Com efeito, seu modelo publicamente declarado era...o norte-americano.

Todavia, em bases capitalistas não há perspectivas para paises como Cuba e a Venezuela. A tentativa de Castro de realizar reformas para melhoria das condições do povo cubano imediatamente puseram-no em conflito com o imperialismo dos estados Unidos e os grandes monopólios da mesma nacionalidade controladores da economia cubana. A fim de defender os ganhos da revolução, Castro foi obrigado a nacionalizar propriedades do imperialismo americano e eliminar o capitalismo em Cuba.

Posto que a revolução cubana não seguisse o modelo clássico da Revolução de Outubro, e os trabalhadores nunca ocupassem o poder através de conselhos democraticamente eleitos, Castro teve, não obstante, o apoio das massas, e a expropriação dos latifúndios e do capitalismo em Cuba representou um golpe para o imperialismo e grande passo avante. O imperialismo americano chamuscou seriamente seus dedos em Cuba. Sua tentativa para destruir a revolução depositando sua confiança nas forças contra-revolucionárias, armadas e financiadas pela CIA, terminou em humilhante derrota na Baía dos Porcos.

Não há dúvida que Washington temia que Chavez pudesse palmilhar o caminho idêntico ao de Castro, que se sabe o admira. Isto parece improvável. Chavez não pode esperar ajuda de Havana. O regime cubano precisa manter-se fora disso. Havana limitar-se-á a dar conselhos - e os conselhos incutirão em Chavez a necessidade de não ir muito longe, a não provocar os americanos, e assim por diante. Considerando-se que o próprio Castro não pretende provocar os americanos, de seu ponto de vista este é um parecer saudável. Mas é uma advertência que, se observada, significará a destruição da revolução venezuelana.

O drama ainda não foi encenado. A Venezuela encontra-se ainda em profunda crise econômica; o golfo entre as classes é enorme. Há uma polarização entre a esquerda e a direita. A crise imediata tem resultado em empecilhos para a contra-revolução. Contudo, o conflito está longe de seu final. O equilíbrio de forças que retornou tão decisivamente para Chavez em 13 de abril pode mudar noutra direção da mesma forma e rapidamente. Ele estará sob impiedosa pressão do imperialismo dos Estados Unidos. A burguesia, com o apoio ativo e o encorajamento da CIA, intensificará sua campanha de sabotagem e desestabilização.

Nem ao menos é certo que Chavez tenha apoio suficiente na Assembléia Nacional para manter-se na presidência. Consoante uma avaliação informal, na assembléia e nas forças armadas (FAN), cerca de 75% dos membros da assembléia opõem-se a permitir que Chavez continue na presidência. O ministro do interior e da justiça anterior, Luiz Miquelina, que comanda ponderável bloco de votos moderados dentro do dominante Movimento da Quinta República (MVR), será um elemento chave em qualquer esforço para pôr termo à presidência de Chavez por meios legais e constitucionais. A posição de Chavez é, por este motivo, extremamente precária. Se ele não fizer o que os capitalistas e imperialistas desejam, poderá ser deposto pela própria Assembléia Nacional.

Chavez sem dúvida é um homem honesto, que deseja agir no interesse de seu país e do seu povo. São boas suas intenções. Mas, em política como na vida, as intenções nunca bastam. O problema é que Chavez não é marxista, e tende a ser inconsistente. Isto pode ser fatal em situações onde o equilíbrio de forças é instável. Fosse Chavez marxista, poderia apelar para as massas passando por cima da Assembléia Nacional. A criação de comitês de ação em cada fábrica, refinaria de petróleo e quartel, é único caminho para defender a revolução e desarmar as forças contra-revolucionárias. Deve-se armar a classe operária para sua própria defesa contra o perigo de outro golpe. Somente ações decisivas podem evitar nova crise em que a contra-revolução assumirá um caráter ainda mais violento e assassino.

A posição do exército constitui fator crucial. Os reacionários da caserna sofreram sério revés. Mas já estarão se rearticulando, com a ativa assistência da embaixada dos Estados Unidos. As próximas 24 a 48 horas poderão ser decisivas. Se ações firmes não forem tomadas para desarmar os contra-revolucionários, poderia gerar-se uma guerra civil, com lutas entre unidades militares que suportam Chavez ou a ele se opõem. Se a classe trabalhadora atuar com suficiente energia, as tropas do exército podem rapidamente ser ganhas para o lado da revolução. O melhor da oficialidade assim a seguirá, isolando os elementos reacionários do estado-maior. A revolução pode ainda ter êxito com um mínimo de violência e perda de vidas. Mas se a revolução hesitar, estará perdida. Preparar-se-á o caminho para terrível derramamento de sangue, terminando mais tarde em brutal ditadura militar.

Acima de tudo, é necessário esmagar a resistência patronal e de seus sequazes. Parta-se para a imediata expropriação da propriedade imperialista e da burguesia venezuelana! O único meio de afastar o perigo da contra-revolução é eliminar sua base de sustentação, isto é, expropriando a classe capitalista. Decreto de emergência com este objetivo deve ser posto diante da Assembléia Nacional. Se a contra-revolução tentar bloqueá-lo através da Assembléia Nacional, então a única saída é dissolvê-la e governar através de comitês populares eleitos.

Trabalhadores da Venezuela! Tudo agora despende de ti; Por tuas ações, derrubaste a contra-revolução. Mas tua vitória não está assegurada. Terrível perigo paira sobre tuas cabeças, a de tuas famílias e de teus entes queridos. Lembra-te do que aconteceu no Chile! Não acredites naqueles que afirmam que tudo está resolvido, que a situação deve acalmar, que a democracia está segura nas mãos da Assembléia Nacional! A menos que o domínio dos capitalistas, dos serviçais do imperialismo americano - seja destruído, as conquistas que conseguiste nunca estarão asseguradas.

Confias somente em tua própria resistência e unidade! Constitua comitês de ação para a defender a revolução e derrotar a reação! Amplia-os e liga-os uns com outros, em bases locais, regionais e nacionais. Uma vez o poder da classe trabalhadora esteja organizado, nenhum poder na terra poderá resistir-lhe. O cenário está preparado para o confronto final e inevitável entre o povo trabalhador e as forças da reação.

Enfrentas um inimigo poderoso: o imperialismo americano. Mas na realidade, este inimigo é um colosso com pés de barros. Tens poderosos aliados em milhões de pessoas exploradas e oprimidas na América Latina. Essas pessoas descobrem que têm vez e voz - na Argentina, no Peru, no Equador, na Colômbia - num país após outro os trabalhadores, camponeses e desempregados começam a reagir em defesa de seus interesses. Essas são as reservas de massas populares da revolução venezuelana!

Há muito tempo, Leon Trotsky tratou da revolução permanente. Esta é única perspectiva para paises como a Venezuela. Os fatos devem ser enfrentados. A burguesia não pode desempenhar papel progressista na Venezuela. Apenas sob o domínio da classe trabalhadora podes na verdade resolver os problemas. Fundamentada numa economia socialista planificada, sob o controle democrático e a administração dos próprios trabalhadores, pode-se fdazer imenso progresso. Mas a revolução isolada não pode durar muito. Ou espalha-se para ouros paises, ou será destruída mais cedo ou mais tarde. O internacionalismo é, assim, questão de vida ou de morte para a revolução venezuelana.

Hugo Chavez tem falado da Revolução Bolivariana. Quando Simon Bolívar ergueu a bandeira da luta contra o imperialismo espanhol, tinha em mente uma guerra nacional de libertação que poderia unir todos os povos da América Latina. Mas seu sonho foi traído pelas chamadas burguesias nacionais que empreenderam a balcanização da América Latina. Esta é a verdadeira causa da escravização e opressão do poderoso continente.

A única forma de derrotar o imperialismo dos Estados Unidos é pela união da revolução da Venezuela com as lutas que estão acontecendo em toda a América Latina. Por toda parte, o sistema capitalista está em crise; ele oferece aos povos apenas pobreza, miséria e desemprego. Subjuga todas as nações ao controle do imperialismo norte-americano e à ditadura do capital, transformando as palavras “democracia” e “soberania” em frases sem significado. Tudo o de que se necessita é uma vitória. E, então, os regimes capitalistas, podres e falidos, ruirão por toda parte. O caminho estará aberto para a realização do sonho de Bolívar da única maneira possível - como os Estados Unidos Socialistas da América Latina.

No último dezembro, os trabalhadores argentinos mostraram o caminho. As classes trabalhadoras venezuelanas e argentinas colocam-se agora na linha de frente da revolução latino-americana. Todos os olhos estão agora voltados para a Venezuela. A parada é muito alta. Uma vitória decisiva na Venezuela transformaria todo um estado de coisas. No entanto, a vitória de forma alguma está garantida.

É necessário tirar sérias conclusões dos eventos dos últimos três dias. Não é possível realizar meia revolução. Não é possível melhorar as condições das massas e deixar a burguesia podre e reacionária no controle dos meios de produção. A terra, os bancos e as industrias devem ser retirados de suas mãos. O poder econômico deve estar nas mãos do povo. Esta é a primeira condição para a vitória. Sem isso, nenhum progresso é possível.

O que se torna necessário é uma tendência marxista ousada, que participará do Movimento pela Quinta República (MVR), proporcionado ao mesmo tempo as necessárias perspectivas, estratégias e programa revolucionários. Os elementos para tal tendência já existem. Tudo agora depende da rapidez com que se possam organizar e mobilizar a classe trabalhadora e liderá-la no rumo à vitória. A vitória da revolução venezuelana acenderia uma fogueira que inflamaria toda a América Latina.

Finalmente, em meio a cenas de regozijo, Hugo Chavez foi levado de helicóptero militar ao Palácio Miraflores e reintegrado como presidente da Venezuela.

Provocação contra-revolucionária

A contra-revolução na Venezuela foi desencadeada pelas greves anti-Chavez na indústria petrolífera venezuelana. Eram contra-revolucionárias - o equivalente à greve dos caminhoneiros organizada pela CIA contra o governo de Allende no Chile. Foram organizadas pela administração da industria do petróleo venezuelana, a PDVSA, em aliança com a ala direitista dos burocratas da CTV. Que o movimento simpático à reação tenha sido capitaneado pelos interesses petrolíferos não foi acidental. Os diretores da PDVSA necessitaram pôr termo às restrições relativas à produção petrolífera e retornar à posição prévia na qualidade de único maior fornecedor de petróleo aos Estados Unidos.

O golpe em si decorreu dos eventos de 11 abril, quando uma demonstração dita de 350.000 foi organizada contra o governo Chavez. Desde que a mídia na Venezuela é anti-Chavez de forma virulenta, este número é quase certamente exagerado. Uma agencia noticiosa verificou que os manifestantes realmente não superaram os 50.000. Noticiou-se que as forças de segurança pró-Chavez teriam aberto fogo contra pessoas desarmadas anti-Chavez, matando 15 delas e ferindo outras 157. A ala direitista usou a notícia, real ou falsa, como desculpa para exigir a renúncia do presidente Hugo Chavez. Com efeito, relatos posteriores indicaram que a maior parte dos mortos eram manifestantes pró-Chavez aparentemente alvejados por atiradores de tocaia postados em telhados. Tudo não passou de manifesta provocação.

Os interesses de classe por trás do golpe eram óbvios. O cabeça do governo contra-revolucionário era um rico homem de negócios e dirigente de associação patronal. Sua primeira providência foi extinguir a chamada legislação antiinvestimento de Chavez, isto é, todas as leis que objetivassem defender os interesses da Venezuela e elevar o padrão de vida das massas. A corrupta e podre burguesia venezuelana é incapaz de desempenhar um papel progressista. Se postos em pratica seus planos, isto significaria colocar o país e suas consideráveis reservas petrolíferas sob domínio do imperialismo americano. A administração da PDVSA já tinha traçado um plano para restabelecer e expandir a produção, que podia reconduzir a um nível diário de 300.000 barris acima da quota da OPEP.

O papel do imperialismo dos Estados Unidos

O golpe foi dirigido pela burguesia venezuelana e seus serviçais nas forças armadas. Mas a mão que puxou os cordéis estava obviamente em Washington. O plano nasceu e cresceu nos Estados Unidos. A administração Bush deleitava-se ao pensar em Chavez algemado, e estava se preparando para apossar-se da indústria petrolífera venezuelana pela porta dos fundos, concedendo “ajuda” direcionada ao novo governo de Caracas na forma de investimentos petrolíferos. É a parte mais ampla da estratégia do imperialismo estadunidense, após 11 de setembro, para intervir mais agressivamente por toda parte.

O interesse imperialista na Venezuela é, em parte, econômico. Há comentários na América sobre uma recuperação econômica. Mas é ainda débil e instável. A demanda nos Estados Unidos melhorou, mas na Europa ocorre num passo bem menor, e o Japão permanece em graves apuros. Em tal situação, os mercados petrolíferos são necessariamente voláteis. E qualquer ruptura na produção petrolífera a esta altura teria as mais sérias conseqüências para a economia mundial. O que se requer para uma sólida recuperação não é apenas aumento na demanda (que pode ter caráter episódico), mas uma elevação na lucratividade. As margens de lucro ainda permanecem deprimidas. Um aumento no preço de qualquer um dos fatores de produção deprimiria as margens de lucro ainda mais, empurrando a economia mundial para uma queda até mesmo mais abrupta do que antes. Neste sentido, as convulsões no Oriente Médio pairam tal qual uma ameaçadora nuvem tempestuosa por sobre o cenário econômico.

A questão Israel-palestina está acirrando os ânimos em toda a região de forma alarmante - nela o Hezbollah, a Síria, a Jordânia e o Egito envolvem-se cada vez mais. As coisas ficam mais complicadas! E então vem à baila o preço do petróleo... Este tem flutuado violentamente, implicando em cortes nos suprimentos da OPEP, ameaças de guerra, aumento da violência no Oriente Médio e instabilidade política na própria Venezuela. O caos no Oriente Médio parece ter forçado Washington a adiar seus planos para atacar o Iraque. Tudo indica que a reunião cume do último fim de semana entre o presidente dos Estados Unidos e o primeiro-ministro Tony Blair em Crawford (Texas) não produziu resultados muito positivos. Até mesmo um entusiasta de guerras tal qual Tony Blair foi compelido a advertir Bush, reservadamente, de que por vezes é melhor avaliar as circunstâncias antes de agir. O adiamento não significa, porém, abandono da idéia. Mais cedo ou mais tarde botas americanas pisarão no Iraque.

Bush está determinado a insistir com seus planos de agressão militar ao Iraque, mas sente-se desconfortavelmente ciente de que o caos geral no Oriente Médio - acentuado pelo fracasso da missão de Powell em forçar uma retirada de Israel na Palestina - pode levar a uma queda catastrófica da produção petrolífera, o que, de resto, poderia conduzir a uma brusca elevação de preços e ao afastamento de qualquer perspectiva de recuperação econômica. Os Estados Unidos têm urgente necessidade de garantir o fornecimento do petróleo situado a cômoda distância de milhares de milhas do Oriente Médio.

Os imperialistas procuram manter baixo o preço do petróleo. Há rumores indicativos de que os produtores russos, seguindo o alinhamento colaboracionista de Putin com o imperialismo estadunidense, traçam planos para abocanhar fatia do mercado iraquiano antes do 30º dia do fim do embargo da exportação de petróleo, convocado no começo desta semana, em protesto pela recente ocupação de territórios palestinos na Margem Ocidental. Neste drama de alcance mundial, a Venezuela é um peão ponderável. As políticas de Hugo Chavez ameaçavam os interesses das grandes consórcios petrolíferos causando maior preocupação para as bandas de Washington.

Com a crescente instabilidade no Oriente Médio - onde o Iraque acaba de reduzir sua produção petrolífera - interessa os Estados Unidos restringirem a coesão da OPEP. Antes da posse de Chavez, em fevereiro de 1999, a Venezuela era que desrespeitava as quotas estabelecidas pela OPEP. Recentemente, à altura de dezembro de 1999, a Venezuela estava excedendo sua quota de produção num milhão de barris. Mas o novo governo, em sua tentativa de opor-se ao imperialismo dos Estados Unidos, transformou-se no mais entusiástico respeitador das quotas. Durante sua presidência, Chavez pressionou em prol de numerosos cortes na produção e deu uma volta pelo mundo no ano passado para forçar reduções, obtendo algum êxito. Isto inevitavelmente colocou a Venezuela em conflito com as grandes companhias de petróleo e o imperialismo americano.

Mas há uma dimensão mais ampla para as atividades do imperialismo americano na Venezuela, que em muito transcende a questão econômica. O setor militar norte-americano está ativamente envolvido na guerra suja contra as guerrilhas da FARC e da ELN na vizinha Colômbia. É sobejamente conhecido que Chavez mantinha relacionamento amistoso com as guerrilhas colombianas. O fato constituiria razão suficiente para a CIA buscar sua deposição.

No entanto, a razão principal não é nada disso. O fundamental é que a radicalização das massas na Venezuela ameaçava espalhar-se por outros paises latino-americanos, vasta região que se encontra no momento angustiada por profunda crise econômico-social. Ao remover Chavez do poder, o imperialismo americano esperava apertar suas garras em torno a América Latina. Seria uma lição para as massas noutros paises. E, por acréscimo, a instalação de governantes mais amigáveis e flexíveis em Caracas levaria a um aumento da produção petrolífera venezuelana, e conseqüentemente implicaria em maior estabilidade dos preços do petróleo. Em resumo, uma proposição de negócios muito saudável! Tudo isto requeria um pequeno golpe.

Previsivelmente, o golpe direitista foi recebido com mal disfarçada satisfação pela burguesia internacional. Estes hipócritas descreveram os eventos de 11 de abril como um “retorno à democracia” na Venezuela! Esta foi a linha assumida pelo diário madrileno E Pais. Contudo, o mesmo jornal foi compelido subseqüentemente a divulgar testemunhos pessoais afirmando que eram muitos os casos de brutalidade e violência praticados pelas forças contra-revolucionárias. Partidários de Chavez foram forçados a esconder-se à medida que as forças armadas punham-se a deter os apoiadores do governo. Prisioneiros eram levados a quartéis do exercito onde eram surrados e torturados. Tais são os métodos dos “democratas” burgueses na Venezuela.

O comandante do exército venezuelano general Efraim Vasquez Velasco - principal líder da rebelião - tentou evitar qualquer movimento contra o novo governo ao implementar um agressivo “plano de desarmamento”. O novo regime iniciou imediatamente buscas em propriedades particulares e veículos, com a intenção de apreender todas as armas não registradas e prender adeptos de Chavez. Determinou que o exército atuasse em colaboração com o procurador-geral nacional para “identificar, desarmar e desarticular” as milícias civis organizadas sob a denominação de Círculos Bolivarianos.

Uma caça às feiticeiras foi iniciada contra adeptos de Chavez, membros do parlamento e funcionários do governo legalmente eleito. Vasquez Valasco confirmou que os militares e policiais civis estavam realizando uma busca nacional para deter o vice-presidente Cabello e o prefeito municipal libertador Freddy Bernal, sob alegação de que Cabello era o principal organizador e financiador dos Círculos Bolivarianos armados, e que se supunha Bernal houvesse comandado atiradores de tocaia que alvejaram, em 1’1 de abril, os manifestantes anti-Chavez de telhados de casas no centro de Caracas.

Os reacionários vitoriosos puseram-se sistematicamente a abolir todos os decretos progressistas do governo deposto, que fora eleito por esmagadora maioria. Eles defendiam poderes absolutos para si próprios - gangues de conspiradores não eleitos - enquanto cancelavam 49 decretos de um governo democraticamente eleito, suspendendo e prendendo membros eleitos da Assembléia Nacional, mais 20 juizes (chega de perder tempo em preservar a independência do judiciário!), 12 governadores e todos os prefeitos pró-Clhavez. Todas estas medidas atraíram aplausos das “democracias” ocidentais como “passos destinados à restauração da democracia” na Venezuela! George Orwell poderia escrever uma novela muito boa em torno do tema.

De acordo com todos os relatos disponíveis, os contra-revolucionários conduziam-se excessivamente confiantes. Estavam convencidos que havia pouco ou nenhum perigo de que os adeptos de Chavez pudessem lançar um contra-golpe com êxito para recuperar o controle do governo. No pior dos casos, eles previram o surgimento de algumas ocorrências isoladas de violência em Caracas e noutras áreas urbanas, as quais facilmente podiam controlar. Também temiam que elementos pró-Chavez em áreas rurais pudessem tentar ligar-se às guerrilhas colombianas e empreender operações no território venezuelano.

Mas esses senhores não contavam com a reação das massas venezuelanas.A despeito do fato de que Chavez não houvesse levado a revolução a seu termo, e a crise na Venezuela tivesse começado a gerar efeitos adversos, as massas instintivamente compreenderam a ameaça representada pela contra-revolução. Recuperando-se do choque inicial, tomaram as ruas de Caracas e de outras cidades, varrendo tudo que encontraram pela frente.

O papel das massas populares foi decisivo para derrotar a contra-revolução. Defrontado pela mobilização espontânea das massas, as tentativas para impor uma ditadura diluiu-se. Sem o apoio das forças armadas, a burguesia não podia estabelecer a ditadura. E ainda, a reação popular rapidamente agravou as cisões dentro do exército. Não se supunha que acontecesse! Parece que a presidência de vida curta de Carmona desfez-se porque os burgueses contra-revolucionários - sem dúvida sob pressão da CIA - tentaram ir muito longe e muito depressa, abrindo um racha entre os milicos e um setor dos generais que, muito corretamente, temeram que sobreviesse uma guerra civil.

Os líderes golpistas começaram a cindir-se e a discutir entre si. A partir desse momento, o golpe estava condenado. Stratfor relata fatos que levaram ao colapso:

“As medidas econômicas e políticas anunciadas por Carmona ao assumir o governo em 12 de abril - inclusive a dissolução da Assembléia Nacional e a demissão dos juizes da Suprema Corte e de ouros altos funcionários governamentais - não foi o que tinha sido acordado pelas facções políticas, civis e militares que formavam a coalizão centrodireita de apoio a Carmona e excediam os objetivos da centrodireita moderada.

“O golpe dentro do golpe da ala direita foi montado por um grupo de oficiais militares protegidos do general Ruben Rojas, em parceria com empresários e políticos ultra-conservadores - alguns dos quais afiliados à organização católica extremamente conservadora Opus Dei. O ministro da defesa do governo de Carmona, vice-almirante Hector Ramirez Perez, é protegido de Rojas de longa data, enquanto a escolha de Carmona para o ministério do exterior recaiu em José Rodriguez Iturbe, pertencente às fileiras da Opus Dei.”

Noutras palavras, os reacionários excederam a si mesmos. Quando Carmona anunciou a dissolução da Assembléia Nacional, a coalizão cívico-militar de apoio ao governo provisório de Carmona ruiu imediatamente, enquanto o equilíbrio de forças se voltava em favor de Chavez. Com o crescimento dos protestos nas ruas, o apoio popular e sindicalista a Carmona evaporou-se, e as FAN´s também cindiram-se em pelo menos três grupos distintos agora em luta poder dentro do estamento militar.

Compreendendo que a situação escapava de suas mãos, Vasquez Velasco, numa alocução televisiva condicionou seu apoio a Carmona à imediata reintegração das prerrogativas da Assembléia Nacional. Carmona logo cedeu. Todavia, restabelecidos os poderes da Assembléia Nacional, Lara, seu presidente, às pressas depôs Carmona; Cabelo prestou juramento e foi reempossado como presidente provisório. Enquanto isto, Chavez retornava ao palácio presidencial. A rebelião ruiu como um castelo de cartas. E o exército rachou às escâncaras.

É claro que Chavez ainda conta com considerável apoio, não apenas junto às massas mas também no exército. O general Baduel declarou-se em rebelião contra o governo Carmona mesmo antes que este prestasse juramento e assumisse a presidência em 12 de abril. Exerce o general o comando de um corpo de elite de 2.000 pára-quedistas e um vasto arsenal de armas e munições, o que não constitui ameaça insignificante! O general de divisão Julio Garcia Montoya, secretário efetivo do Conselho Nacional de Segurança e Defesa, também manifestou-se em rebelião e tornou pública sua oposição ao governo interino através de entrevista à televisão cubana, logo depois retransmitida para a Venezuela.

Continua Stratfor: “Um grupo dirigido pelo general Efrain Vasquez Valasco, comandante do exército, que emergiu em 11-12 de abril como líder da facção centrodireita integrada por oficiais de careira que se opõem aos propósitos de politizar as FAN´s e de afastar o país da democracia capitalista. O grupo de Vasquez Velasco negociou o acordo com os dirigentes da oposição que instalou Carmona como presidente provisório de consenso.

“Um segundo grupo compõe-se de oficiais ultra-conservadores em quatro setores das FAN´s. Alguns destes oficiais são de longa data protegidos de Rojas, e outros - inclusive membros da Opus Dei - provenientes do Partido Democrata Cristão-COPEI, por longo tempo dominado pelo ex-presidente Rafael Caldera, que é também sogro de Rojas. As fontes de Stratfor afirmam que este grupo planejou dar um golpe contra Chavez em 27 de fevereiro, mas o intento abortou sobre forte pressão dos camaradas centristas dentro das FAN´s e da administração Bush em Washington.

“O terceiro grupo compõe-se de oficiais pró-Chavez, incluindo o general Raul Baduel, que comanda a 42ª Brigada de Pára-quedistas sediada em Maracay, Estado de Aragua. É a antiga unidade de Chavez; Baduel é um de seus mais íntimos amigos e aliados políticos no exército”, dizem as fontes.

Aléxis de Tocqueville assinalou há muito tempo que a revolução começa no cimo. Os últimos acontecimentos demonstram claramente que a classe dominante na Venezuela está cindida. E o racha estende-se até o topo do estado e das forças armadas. Tal fato, como explicou Lenine, constitui a primeira condição para uma revolução. A tentativa falha da contra-revolução exacerbou essas contradições e cisões da classe dominante, e criou as mais favoráveis condições para uma mudança social completa. Os reacionários forçosamente ficaram na defensiva e, por enquanto estarão paralisados e incapazes de agir. Uma diretriz corajosa vinda de cima seria suficiente para privar a reação de sua base social e permitir até mesmo uma transferência pacífica do poder para a classe trabalhadora.

Há momentos na historia que são decisivos. É uma questão de “isto ...ou aquilo”. A conta-revolução lançou um desafio. Sua primeira tentativa falhou. Mas não será a última! A burguesia e seus pontos de apoio no meio militar estão determinados a ver-se livre de Chavez de uma forma ou de outra. Sua resolução será fortalecida por Washington, que tem muitos motivos para desejar a queda do regime de Chavez.

Marx assinalou que a revolução necessita do látego da contra-revolução. O estado de coisas presente é reminiscência do tancazo do Chile - a primeira tentativa para depor o governo de Allende, derrotada pelo movimento de massas. Não há nenhuma dúvida de que se Salvador Allende tivesse aproveitado o momento para conclamar às massas à ação, a revolução teria facilmente tido êxito. Mas ao desperdiçar-se a oportunidade a contra-revolução nas forças armadas - recordemos que se supunha Pinochet fosse um “democrata” leal - reagrupou-se e preparou o golpe sangrento poucos meses depois. Isto representa séria advertência para os trabalhadores venezuelanos!

Depois dos eventos de 11-12 de abril, a permanece completamente instável. Nada foi solucionado. A situação assemelha-se em muitos aspectos a que existiu em Cuba em 1960. Geralmente não se compreende que quando Castro chegou primeiramente ao poder, não tencionava nacionalizar os meios de produção. Seu programa visava apenas a reformas democráticas que não iam alem das limitações do sistema capitalista. Com efeito, seu modelo publicamente declarado era...o norte-americano.

Todavia, em bases capitalistas não há perspectivas para paises como Cuba e a Venezuela. A tentativa de Castro de realizar reformas para melhoria das condições do povo cubano imediatamente puseram-no em conflito com o imperialismo dos estados Unidos e os grandes monopólios da mesma nacionalidade controladores da economia cubana. A fim de defender os ganhos da revolução, Castro foi obrigado a nacionalizar propriedades do imperialismo americano e eliminar o capitalismo em Cuba.

Posto que a revolução cubana não seguisse o modelo clássico da Revolução de Outubro, e os trabalhadores nunca ocupassem o poder através de conselhos democraticamente eleitos, Castro teve, não obstante, o apoio das massas, e a expropriação dos latifúndios e do capitalismo em Cuba representou um golpe para o imperialismo e grande passo avante. O imperialismo americano chamuscou seriamente seus dedos em Cuba. Sua tentativa para destruir a revolução depositando sua confiança nas forças contra-revolucionárias, armadas e financiadas pela CIA, terminou em humilhante derrota na Baía dos Porcos.

Não há dúvida que Washington temia que Chavez pudesse palmilhar o caminho idêntico ao de Castro, que se sabe o admira. Isto parece improvável. Chavez não pode esperar ajuda de Havana. O regime cubano precisa manter-se fora disso. Havana limitar-se-á a dar conselhos - e os conselhos incutirão em Chavez a necessidade de não ir muito longe, a não provocar os americanos, e assim por diante. Considerando-se que o próprio Castro não pretende provocar os americanos, de seu ponto de vista este é um parecer saudável. Mas é uma advertência que, se observada, significará a destruição da revolução venezuelana.

O drama ainda não foi encenado. A Venezuela encontra-se ainda em profunda crise econômica; o golfo entre as classes é enorme. Há uma polarização entre a esquerda e a direita. A crise imediata tem resultado em empecilhos para a contra-revolução. Contudo, o conflito está longe de seu final. O equilíbrio de forças que retornou tão decisivamente para Chavez em 13 de abril pode mudar noutra direção da mesma forma e rapidamente. Ele estará sob impiedosa pressão do imperialismo dos Estados Unidos. A burguesia, com o apoio ativo e o encorajamento da CIA, intensificará sua campanha de sabotagem e desestabilização.

Nem ao menos é certo que Chavez tenha apoio suficiente na Assembléia Nacional para manter-se na presidência. Consoante uma avaliação informal, na assembléia e nas forças armadas (FAN), cerca de 75% dos membros da assembléia opõem-se a permitir que Chavez continue na presidência. O ministro do interior e da justiça anterior, Luiz Miquelina, que comanda ponderável bloco de votos moderados dentro do dominante Movimento da Quinta República (MVR), será um elemento chave em qualquer esforço para pôr termo à presidência de Chavez por meios legais e constitucionais. A posição de Chavez é, por este motivo, extremamente precária. Se ele não fizer o que os capitalistas e imperialistas desejam, poderá ser deposto pela própria Assembléia Nacional.

Chavez sem dúvida é um homem honesto, que deseja agir no interesse de seu país e do seu povo. São boas suas intenções. Mas, em política como na vida, as intenções nunca bastam. O problema é que Chavez não é marxista, e tende a ser inconsistente. Isto pode ser fatal em situações onde o equilíbrio de forças é instável. Fosse Chavez marxista, poderia apelar para as massas passando por cima da Assembléia Nacional. A criação de comitês de ação em cada fábrica, refinaria de petróleo e quartel, é único caminho para defender a revolução e desarmar as forças contra-revolucionárias. Deve-se armar a classe operária para sua própria defesa contra o perigo de outro golpe. Somente ações decisivas podem evitar nova crise em que a contra-revolução assumirá um caráter ainda mais violento e assassino.

A posição do exército constitui fator crucial. Os reacionários da caserna sofreram sério revés. Mas já estarão se rearticulando, com a ativa assistência da embaixada dos Estados Unidos. As próximas 24 a 48 horas poderão ser decisivas. Se ações firmes não forem tomadas para desarmar os contra-revolucionários, poderia gerar-se uma guerra civil, com lutas entre unidades militares que suportam Chavez ou a ele se opõem. Se a classe trabalhadora atuar com suficiente energia, as tropas do exército podem rapidamente ser ganhas para o lado da revolução. O melhor da oficialidade assim a seguirá, isolando os elementos reacionários do estado-maior. A revolução pode ainda ter êxito com um mínimo de violência e perda de vidas. Mas se a revolução hesitar, estará perdida. Preparar-se-á o caminho para terrível derramamento de sangue, terminando mais tarde em brutal ditadura militar.

Acima de tudo, é necessário esmagar a resistência patronal e de seus sequazes. Parta-se para a imediata expropriação da propriedade imperialista e da burguesia venezuelana! O único meio de afastar o perigo da contra-revolução é eliminar sua base de sustentação, isto é, expropriando a classe capitalista. Decreto de emergência com este objetivo deve ser posto diante da Assembléia Nacional. Se a contra-revolução tentar bloqueá-lo através da Assembléia Nacional, então a única saída é dissolvê-la e governar através de comitês populares eleitos.

Trabalhadores da Venezuela! Tudo agora despende de ti; Por tuas ações, derrubaste a contra-revolução. Mas tua vitória não está assegurada. Terrível perigo paira sobre tuas cabeças, a de tuas famílias e de teus entes queridos. Lembra-te do que aconteceu no Chile! Não acredites naqueles que afirmam que tudo está resolvido, que a situação deve acalmar, que a democracia está segura nas mãos da Assembléia Nacional! A menos que o domínio dos capitalistas, dos serviçais do imperialismo americano - seja destruído, as conquistas que conseguiste nunca estarão asseguradas.

Confias somente em tua própria resistência e unidade! Constitua comitês de ação para a defender a revolução e derrotar a reação! Amplia-os e liga-os uns com outros, em bases locais, regionais e nacionais. Uma vez o poder da classe trabalhadora esteja organizado, nenhum poder na terra poderá resistir-lhe. O cenário está preparado para o confronto final e inevitável entre o povo trabalhador e as forças da reação.

Enfrentas um inimigo poderoso: o imperialismo americano. Mas na realidade, este inimigo é um colosso com pés de barros. Tens poderosos aliados em milhões de pessoas exploradas e oprimidas na América Latina. Essas pessoas descobrem que têm vez e voz - na Argentina, no Peru, no Equador, na Colômbia - num país após outro os trabalhadores, camponeses e desempregados começam a reagir em defesa de seus interesses. Essas são as reservas de massas populares da revolução venezuelana!

Há muito tempo, Leon Trotsky tratou da revolução permanente. Esta é única perspectiva para paises como a Venezuela. Os fatos devem ser enfrentados. A burguesia não pode desempenhar papel progressista na Venezuela. Apenas sob o domínio da classe trabalhadora podes na verdade resolver os problemas. Fundamentada numa economia socialista planificada, sob o controle democrático e a administração dos próprios trabalhadores, pode-se fdazer imenso progresso. Mas a revolução isolada não pode durar muito. Ou espalha-se para ouros paises, ou será destruída mais cedo ou mais tarde. O internacionalismo é, assim, questão de vida ou de morte para a revolução venezuelana.

Hugo Chavez tem falado da Revolução Bolivariana. Quando Simon Bolívar ergueu a bandeira da luta contra o imperialismo espanhol, tinha em mente uma guerra nacional de libertação que poderia unir todos os povos da América Latina. Mas seu sonho foi traído pelas chamadas burguesias nacionais que empreenderam a balcanização da América Latina. Esta é a verdadeira causa da escravização e opressão do poderoso continente.

A única forma de derrotar o imperialismo dos Estados Unidos é pela união da revolução da Venezuela com as lutas que estão acontecendo em toda a América Latina. Por toda parte, o sistema capitalista está em crise; ele oferece aos povos apenas pobreza, miséria e desemprego. Subjuga todas as nações ao controle do imperialismo norte-americano e à ditadura do capital, transformando as palavras “democracia” e “soberania” em frases sem significado. Tudo o de que se necessita é uma vitória. E, então, os regimes capitalistas, podres e falidos, ruirão por toda parte. O caminho estará aberto para a realização do sonho de Bolívar da única maneira possível - como os Estados Unidos Socialistas da América Latina.

No último dezembro, os trabalhadores argentinos mostraram o caminho. As classes trabalhadoras venezuelanas e argentinas colocam-se agora na linha de frente da revolução latino-americana. Todos os olhos estão agora voltados para a Venezuela. A parada é muito alta. Uma vitória decisiva na Venezuela transformaria todo um estado de coisas. No entanto, a vitória de forma alguma está garantida.

É necessário tirar sérias conclusões dos eventos dos últimos três dias. Não é possível realizar meia revolução. Não é possível melhorar as condições das massas e deixar a burguesia podre e reacionária no controle dos meios de produção. A terra, os bancos e as industrias devem ser retirados de suas mãos. O poder econômico deve estar nas mãos do povo. Esta é a primeira condição para a vitória. Sem isso, nenhum progresso é possível.

O que se torna necessário é uma tendência marxista ousada, que participará do Movimento pela Quinta República (MVR), proporcionado ao mesmo tempo as necessárias perspectivas, estratégias e programa revolucionários. Os elementos para tal tendência já existem. Tudo agora depende da rapidez com que se possam organizar e mobilizar a classe trabalhadora e liderá-la no rumo à vitória. A vitória da revolução venezuelana acenderia uma fogueira que inflamaria toda a América Latina.